A aposentadoria do portador de HIV assintomático deve considerar critérios de incapacidade para o trabalho além da sua condição física e a medição da imunidade.
Quando falamos de aposentadoria para o portador de HIV, por certo, nos referimos a Aposentadoria por Invalidez do portador de HIV.
Também existe o auxílio-doença, bem como outros benefícios, mas nesse artigo nos referimos mais à Aposentadoria por Invalidez.
Não se pode ignorar o fato de que a AIDS é uma doença estigmatizante e excludente ao ponto de levar o portador ao ostracismo.
Afasta-o tanto da vida em sociedade quanto do mercado de trabalho.
No entanto, ainda há o entendimento de que o segurado acometido pela síndrome da imunodeficiência adquirida deve comprovar sua incapacidade permanente para o trabalho.
Ou seja, se o laudo do perito concluir que não há incapacidade, e que o portador está assintomático, não haveria direito à aposentadoria por invalidez.
O “Pente Fino” sobre a Aposentadoria do portador de HIV assintomático
O Pente Fino do INSS é um processo de revisão dos benefícios por incapacidade e vem sendo feito desde 2016, primordialmente com o objetivo de encontrar fraudes.
Em suma, o Pente Fino serve para verificar se o segurado já recuperou a capacidade para o trabalho.
Porém, acaba dificultando os processos de renovação ou mesmo a manutenção de benefícios, como a Aposentadoria por Invalidez.
Apesar desta “força tarefa” ser prevista, a Lei previdenciária trás algumas exceções.
Por exemplo, quando deixa de exigir a reavaliação pericial para quem tem mais de 60 anos.
Entretanto, com essas convocações para revisão os peritos do INSS vem considerando apenas os resultados de exames e dando alta previdenciária. Por exemplo, consideram apenas a condições físicas do segurado através da contagem do linfócito CD4.
Inegavelmente que essa atitude não é compatível com os Princípios de Direitos Constitucionais e Humanos, pois fere diretamente a dignidade da pessoa humana.
Avaliação da incapacidade do portador de HIV
Como dizia, para avaliar a incapacidade, ou recuperação, é provável que o INSS verifique apenas o grau da doença através da contagem de linfócitos T-CD4 e medição da carga viral do HIV.
Ou seja, o médico do INSS “dá uma olhada” nas condições físicas do segurado e apenas verifica a medição da carga viral e a contagem de linfócitos CD4.
Mesmo o resultado do exame CD4 deve ser analisado com prudência e juntamente com outras informações clínicas dos pacientes.
Só que, nem sempre uma pessoa com uma boa contagem de linfócitos CD4 está capaz para o trabalho, pois podem sofrer com doenças oportunistas, manifestar sequelas da síndrome, ou reações adversas violentas ao tratamento.
Assim, a aposentadoria do portador de HIV assintomático, visa proteger àqueles que sofrem, com sequelas da doença, com reações ao uso prolongado dos medicamentos, com um processo de envelhecimento acelerado, etc.
Qual é o CD4 de uma “pessoa normal”?
Apenas como referência, uma pessoa com uma boa contagem de CD4 deve estar acima de 500 células por milímetro cúbico, por outro lado, se possuir uma contagem menor que 200 células por milímetro cúbico, significa que possui imunossupressão avançada.
Enfim, quando o perito do INSS verifica uma contagem superior à 500, ele considera o segurado capaz de voltar ao trabalho, sem considerar outros critérios.
Efeitos “assintomáticos” do HIV
Lamentavelmente, é comum segurados já aposentados abandonarem o tratamento para saírem deste quadro assintomático e, decerto, saírem deste “Limbo Previdenciário”.
Antes de uma atitude radical e imprudente, é indicado juntar diversos atestados de médicos infectologistas vinculados à Secretaria de Saúde do seu município ou de algum centro de referência em doenças infecciosas.
Estes especialistas atestam não apenas a contagem CD4, como também a presença de outras doenças infecciosas e parasitárias.
Assim, faz jus a aposentadoria o portador assintomático de HIV, pelo fato da incapacidade não estar atrelada apenas à resultados positivos nos exames.
Apesar de uma resposta satisfatória ao tratamento, estando assintomático naquele momento, pode não haver capacidade laboral que justifique a alta.
Critérios biopsicossociais devem ser considerados para avaliar a incapacidade do portador de HIV.
O INSS não pode se negar a acompanhar a recuperação da capacidade de trabalho de segurados incapazes e deve considerar a melhora na saúde, bem como, a sua reabilitação para o mercado de trabalho.
Dignidade da pessoa humana
Certamente que este procedimento adotado pelo INSS não está de acordo com as normas Constitucionais e desrespeita os princípios da proteção social e da dignidade da pessoa humana.
Estas operações de reavaliação, na verdade, focam apenas o caráter monetário da Previdência. Entretanto, esta atitude não é compatível com uma Previdência Social, cujo princípio é a proteção social.
Também não se pode negar que a AIDS é uma moléstia socialmente estigmatizante, ainda mais nos casos com manifestações físicas e dermatológicas aparentes.
Dessa forma, considerando o conceito biopsicossocial que envolve a doença, é factível o restabelecimento da aposentadoria por invalidez do portador de HIV diante da sua incapacidade indeterminada para o trabalho.
Em contraste com esta postura do INSS, surgem decisões que amparam àqueles que muitas vezes dependem apenas da aposentadoria.
Lei 13.457/2017 já previa a dispensa da perícia médica ao portador de HIV
Desde 2017 já há a possibilidade de dispensa da perícia médica, não apenas para o portador de HIV, mas como qualquer beneficiário de Aposentadoria por Invalidez, que tenha mais de 60, ou que tenha mais de 55 anos de idade e mais de 15 anos de incapacidade.
Sendo assim, mesmo que assintomático no momento, se cumprir estes requisitos já não poderia ser convocado para perícia, muito menos ter seu benefício cassado.
Essa dispensa da reavaliação médica, similarmente do Pente Fino, para os portadores assintomáticos do HIV aposentados por invalidez refere-se à um Direito Líquido e Certo.
Se, eventualmente, esse direito for desrespeitado e o segurado convocado para perícia poderá ingressar com mandado de segurança contra este abuso.
Sem dúvida que o segurado aposentado por invalidez está obrigado, sob pena de suspensão do benefício, a submeter-se a exame médico da Previdência Social, mas também há estas exceções.
Lei 13.847/2019 e a Aposentadoria do portador de HIV assintomático
Da mesma forma, atualmente a Lei 13.847/2019 cria uma nova isenção de reavaliação pericial, dispensando as pessoas com HIV que tenham sido aposentadas por invalidez.
O portador de HIV aposentado por invalidez esta dispensado do Pente Fino, ou qualquer tipo de convocação para perícia médica periódica
De maneira idêntica, isonômica, àqueles segurados já aposentados, mesmo que assintomáticos, que tiverem sua aposentadoria cessada também poderiam valer-se desse direito?
Entendo que sim, por uma questão de isonomia, de proteção social, mesmo que o benefício tenha sido cassado antes de julho de 2019
O portador de HIV assintomático pode pedir os 25% de acréscimo na aposentadoria por invalidez?
O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento).
Ou seja, se assintomático ou não, caso precise de assistência permanente de terceiros, terá direito ao adiciona da grande invalidez.
É muito provável que o portador assintomático não dependa de cuidados de terceiros, mas caso isso ocorra, seja por uma doença oportunista ou qualquer outro fator, terá direito ao adicional desde que esta dependência seja permanente.
Veja como solicitar e o que diz a página do INSS sobre o acréscimo de 25% na Aposentadoria por Invalidez.
Ressalto que a isenção à perícia médica tratada anteriormente não se aplica quando o a perícia tem a finalidade de atestar a necessidade permanente de cuidados de terceiros para o adicional.
Como também não se aplica para concessão de curatela judicial.
Discriminação e Estigma
Frequentemente os portadores de HIV sofrem com a perda de seus direitos.
Não apenas a discriminação social, mas também o estigma institucional que a doença carrega. É triste quando este estigma vem de uma instituição pública.
A discriminação pode afetar a saúde, a liberdade, o trabalho, entre outros diversos direitos Sociais e Humanos.
Esta estigmatização pode obstruir o acesso à Justiça aos serviços sociais, de educação, e de saúde.
Um estudo da UNAIDS Brasil revelou o peso da estigmatização sobre os portadores de HIV que sofre cotidianamente discriminação desde comentários pejorativos dentro da sua própria família, ou assédio verbal e perda do emprego, e até mesmo agressões físicas.
Em suma, essa cessação pela Autarquia é cruel e fere os Direitos Fundamentais da pessoa portadora do vírus da AIDS , os Direitos Constitucionais à Saúde e a Dignidade da Pessoa Humana,
Afinal ”Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal” – Art. 3, da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Jurisprudência sobre a Aposentadoria do portador de HIV assintomático
Precipuamente, a Jurisprudência dos Tribunais caminha no sentido de concessão da aposentadoria por invalidez mesmo para portadores de HIV assintomáticos.
Evidenciados nos autos a probabilidade do direito e o perigo de dano, e considerando-se especialmente o estigma social enfrentado pelos portadores do vírus HIV, associado à dificuldade de inserção no mercado de trabalho, deve ser deferida a tutela de urgência, determinando-se a imediata reimplantação do benefício de auxílio-doença em favor da parte agravante
Ainda que a perícia tenha concluído pela incapacidade apenas temporária do segurado para o exercício de atividades laborativas, possível a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez no caso do portador do vírus da SIDA, considerando-se o contexto social e a extrema dificuldade para recolocação no mercado de trabalho, em virtude do notório preconceito sofrido
Suspeita-se que hajam mais de 25.000 portadores assintomáticos de HIV nesse “limbo” previdenciário.
Quando o INSS não reconhece a incapacidade o jeito é buscar a Justiça, e isso só é possível através de um advogado.
O fato é que, independente dos resultados positivos de exames e da resposta satisfatória ao tratamento, muitos portadores jamais tornar-se-ão capazes para o trabalho, tendo em vista sua condição física, as sequelas da doença, as reações à medicação que vão surgindo estigmatizando-o.
Esclareço que este artigo trás fundamentalmente uma opinião técnica, mas também uma opinião pessoal, pois é impossível de desassociá-las tendo em vista as situações de ofensa à Direitos Fundamentais que encontramos rotineiramente.
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